quarta-feira, 1 de janeiro de 2025

ANTES DE COMEÇAR, ALGUMAS PALAVRAS...


Aquele homem acredita saber alguma coisa, sem sabê-la, enquanto eu, como não sei nada, também estou certo de não saber. - Platão sobre o filósofo Sócrates

É muito difícil escrever sobre qualquer religião. As impressões que marcam o caminho religioso, passam por diferentes graus de aprendizado que se somam ao histórico pessoal daquele que busca o conhecimento. Esse histórico pessoal inclui o local de nascimento, a família, o estudo formal (escolaridade), a formação total do ser humano e como ele enxerga a vida. Escolher uma religião, não é apenas uma questão prática e racional mas uma decisão que passa tanto pela cabeça, quanto pelo coração. E no caso da Umbanda, dizem que não é a gente quem escolhe, ela que escolhe a gente.

Acredito que um dos maiores desafios que a Umbanda apresente como religião, seja o seu alto grau de imersão. Não basta apenas ler os livros a respeito, assim como você não vai sentir o frescor da grama nos seus pés, olhando uma foto. A Umbanda pede ação e participação ativa em todos os seus trabalhos. Você tem que estar presente de corpo e alma. Você tem que estar lá. Ao meu ver, o desafio não é brigar pelo reconhecimento da Umbanda em relação ao que já existe, isso já passou. O desafio é você estar lá e manter sua Fé. Uma Fé (de onde a palavra fidelidade saiu) clara, simples e cristalina que some conhecimento prático com estudo (muito estudo!) teórico. Para mim, este é maior o desafio de todos os dias para cada médium.

Este blog, Umbandoquê, é uma oferenda. Uma oferenda do que vivi e aprendi em quase 20 anos de Umbanda, em uma único terreiro. Portanto, é a minha experiência e não a sua. É o meu ponto de vista e não o seu. E assim sendo, representa um olhar em particular. Em outras palavras, não interprete o que você ler aqui como um fundamento e sim como impressões de um médium de Umbanda e suas experiências pessoais, ok?

O que você precisa saber sobre este blog

  • No Umbandoquê você vai encontrar artigos sobre História, Música, Literatura mas não vai encontrar trabalhos de Umbanda. Não compartilho trabalhos feitos no terreiro que participei e não coloco trabalhos de outros sites. Do meu ponto de vista, isso pode ser usado de forma negativa por médiuns iniciantes e prejudicar ainda mais o caminho espiritual;
  •  Não realizo consultas pessoais, jogos de búzios, interpretação de sonhos e qualquer tipo de cobrança relativa ao trabalho espiritual. Simplesmente, não é a minha praia. Dúvidas e perguntas sobre trabalhos também não serão respondidas porque cada terreiro aprende de uma maneira particular como interpretar o que deve ser feito. Antes de perguntar aqui, converse com o dirigente do seu terreiro. Prometo responder sobre perguntas sobre Umbanda da melhor forma que puder;
  • Confirmação de nomes, linhas ou Orixás também são de responsabilidade do dirigente do terreiro que o médium (iniciante ou não) frequenta. Nesta questão, é mais fácil complicar do que ajudar. Tenha paciência e aguarde que suas entidades ou o dirigente confirme para você;
  •  Por fim, o Umbandoquê não possui outras mídias como Twitter, Instagram Whatsapp, etc. É o blog e sua página no Facebook. Peço a gentileza de ser notificado, caso você receba ou compartilhe algo sobre Umbanda com o nome Umbandoquê. E, só para lembrar, comentários preconceituosos, racistas ou com uso de palavrão, serão excluídos na hora. Eu não discuto religião e não participo de nenhuma "polêmica" que envolva a Umbanda; 
Então é isso. Desejo que todos que apareçam por aqui, possam, de alguma forma, obter algum tipo de apredizado que ajude no seu desenvolvimento espiritual mas, principalmente, no seu crescimento como ser humano. O blog só vai crescer com a sua participação. Mande suas dúvidas e compartilhe, ok?
Axé, bem-vindos e agradecido pela visita.





























 
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sábado, 7 de janeiro de 2017

SATURNO E A REGÊNCIA DOS ORIXÁS

Sua cabeça é seu Guia - Ditado Popular
Todo Ano Novo, é a mesma coisa: começa janeiro e "chovem" Orixás regentes do período em questão. Isso pode complicar um pouco, já que filhos de terreiro que não tem o próprio Orixá assentado e não sabem fazer o seu Odu, tomam como base as energias do Orixá ou Orixás que o regente da Casa escolhe. E muita gente ainda acredita em "Orixá Ruim" e coisa e tal. 

Então, vamos por partes: primeiro, não existe Orixá Ruim, existe energia mal aproveitada ou desperdiçada e, ainda, excesso de energia em contenção. Nenhum cientista vai te falar "Seu elétron malvado, vai ficar de castigo" ou "Tempestade sacana, pare de inundar tudo". Biologia e Natureza não possuem personalidade e ponto final. Agora, quando você está na frequência de um Orixá, é preciso ter mais foco e alguns cuidados. Frequência tem dois significados, aquele do rádio sintonizado e aquilo que acontece quase sempre ou seja, com frequência. 

Essa é uma das formas que você pode entender uma regência: uma energia que vai atuar com frequência na sua vida, ok?

2017 - O ANO DE SATURNO E MAIS QUEM?

O Sombra, sabe - frase de um personagem de rádio, famoso nos EUA, na década de 50
Eu fico meio impressionado como as pessoas escolhem no que acreditar ou não, sabe. Por exemplo, ainda tem muito umbandista que acredita, literalmente, que Yemanjá é uma mulher que veste azul mas não acredita que a Astrologia funcione como uma ferramenta útil para conhecer mais sobre si mesmo e melhorar a sua frequência (vou repetir até você não esquecer) espiritual. Talvez seja um problema de informação ou mais conhecimento, sei lá. Vamos falar um pouco de Saturno.

Saturno é aquele planeta com anéis lindões em volta, uma grande bola de gás, distante do planeta Terra e tal. Saturno também é aquele Titã que comia os próprios filhos para não se destronado (leia aqui). O que interessa pra gente é o simbolismo de Saturno que pode ser resumido em algumas palavras-chave:


Existem centenas de sites de Astrologia que falam de Saturno e o nosso negócio é falar de Orixá. Então, a tabela acima é para te dar um resumo da regência desse planeta que vai ficar por 36 anos (isso mesmo) em cima da gente, até a chegada de Vênus. Experimente encontrar a equivalência positiva de Saturno em algum Orixá que você conheça. Agora, a negativa. Eu espero :)

Pronto. Você já deve ter imaginado uns dois ou três Orixás que possuam as características de Saturno. Lembrando que, para descobrir a regência de um Orixá do Ano, o Babalaô precisa jogar os búzios, fazer o Odu do Ano e ainda consultar suas próprias entidades para descobrir se precisa aproximar ou afastar determinadas energias que possam afetar o progresso do terreiro. Então, nada de ficar julgando se um terreiro está certo e o outro errado porque o Orixá é mais embaixo, ok?

O que vem a seguir são as minhas impressões sobre a regência de 2017. Sua Cabeça (Ori) é seu Guia (Orixá Regente), lembra? É o que eu penso e você não precisa acreditar em mim. Aliás, convido sempre a deixar seus comentários no final deste artigo.

EXU, XANGÔ, OBALUAIÊ E O TEMPO

Tempo é o senhor das estações do ano; regente das mutações climáticas. Pai da maionga, o banho da Nação Angola. Quatro é o número da Terra; quatro foram os dias que Olorum levou para criar o mundo; a cada dia, Olorum criou quatro Odus – num total de 16; quatro são as estações do ano: verão, inverno, outono e primavera; quatro são os elementais da natureza: fogo, água, terra e ar. Ligado a este numero quatro, está o Orixá Tempo – de origem Angola e Congo – semelhante ao Iroko, da Nação Ketu e a Loko, de Nação Jeje. - Fonte aqui
Gosto muito da imagem acima porque possui vários simbolismos. Temos uma encruzilhada em cruz, diferentes plantações que estão em momentos diferentes de crescimento e o conjunto forma as quatro direções do Mundo. E tudo isso, apenas em uma foto!

Saturno é um planeta ligado ao Tempo por tabela. Ele representa a passagem das estações e o momento da colheita, a terra que espera a semente e a retirada do plantio. Também está ligado ao desperdício desse mesmo Tempo e ao apodrecimento daquilo que não é colhido ou usado no momento certo.

Saturno é representado como um velho com uma perna de pau que carrega um grande foice (igualzinho aquele que a Morte carrega). Ele surge no momento em que alguma coisa precisa ser colhida e outra precisa ser ceifada, cortada para sempre.


Além do Tempo, Saturno encontra grandes semelhanças com Obaluaiê, Orixá conhecido por sua lentidão, sua ligação primordial com a Terra material (e, no sentido espiritual, Gaia), além da manutenção do Ciclo da Vida e da Morte. Em uma Lenda de Obaluaiê, ele promete curar uma cidade inteira de uma doença, se for nomeado Rei. É o que acontece, dando início a uma Era de prosperidade e riquezas para cidade. Saturno realizou o mesmo pelos Romanos (veja aqui). E, vale dizer, para os africanos, Saturno é representado como um velho de barba curta e com flores nos cabelos.

E Xangô? Pois é, existe até um certo debate sobre isso. Xangô, Orixá mais identificado pelo seu papel de Legislador da Justiça, também possui uma forte ligação com o Tempo e, principalmente, o Carma. Não dá pra explicar Carma aqui mas basta dizer que Xangô, no aspecto Saturnino, é aquele que promove as mudanças necessárias para que a pessoa saia da encruzilhada em que se meteu e volte para o seu caminho designado por seu Odu de Destino. 

Xangô aplica as Leis Cármicas (que são 12 e você pode ler aqui) no Tempo Espiritual e no Tempo Terreno ou Cronológico (que vem de Cronos, outro nome associado a Saturno). Reparou na palavra "Estatuto" que aparece nos potenciais positivos de Saturno? É em Xangô que voltamos a respeitar o nosso próprio Tempo Interior, as Leis da Natureza e mesmo da sociedade em que vivemos. Xangô estabelece o "Estado" das coisas, seja no sentido organizacional quanto no sentido do Estado do Ser. Legal, né? Nem tanto...

SATURNO ATUANDO COMO CARMA


Ele matou um pássaro ontem, com uma pedra que somente hoje atirou. - Oriki Africano de Exu
Achou que eu tinha esquecido de Exu, né? Nem pensar, é que Exu é aquele que está presente em tudo, antes do Começo e antes do Fim e no Meio. Tem muito Babalaô que nem coloca Exu nos regentes do ano porque, para quem é da religião, isso é óbvio. Se você encontrou algum sentido nas explicações acima, não custa lembrar que Exu está sempre junto com cada Orixá, trabalhando os aspectos evolutivos, de acordo com o Odu de cada um e seu progresso pessoal (seja para cima ou para baixo porque também existe progresso pro mal). Então, é bom ficar esperto!

Vamos reunir tudo que foi falado até agora, que tal?

A palavra regente vem de "Rei", aquele que governa. O planeta Saturno leva 28 anos para circular o Sol. Em termos simbólicos, ele "dá uma passadinha" nas grandes fases da sua vida que ocorrem a cada 7 anos. Na Astrologia, este são os "pequenos retornos de Saturno" que fazem pequenos reajustes de rota para sua vida. Quando você completa 28 anos, temos o "Grande Retorno de Saturno", uma fase de transformações mais radicais e fundamentais pra quem capotou na curva ou se perdeu na encruzilhada. O momento é complexo e aconselho você a procurar livros (como "Saturno" de Liz Greene) e sites sobre o assunto porque temos que falar de Orixá, né?


Exu, Obaluaiê, Xangô e o Tempo. Que turma, hein? Em termos pessoais, essa galera pode gerar uma grande retomada à Ordem na sua vida. Saturno é conhecido por ser duro mas justo, assim como Xangô. Saturno é conhecido por cortar, radicalmente, aquilo que está errado na sua vida, apontando a certeza do sim e do não, assim como Exu. Obaluaiê é aquele que estabelece limites e organização, da mesma forma que acontece com uma plantação. Tempo para colher e plantar, paciência, determinação e respeito são características, tanto de Saturno quanto Obaluaiê. Deu pra entender?

Sua matéria (lado de fora) e sua Alma (lado de dentro) precisam entrar em sintonia, estarem na mesma frequência ou num "Estado do Ser". Que estado vai ser esse, é você quem escolhe. Isso serve para tudo, mesmo que no seu terreiro, o dirigente tenha escolhido, por exemplo, Oxossi/Yemanjá/Nanã como regentes de 2017. Isso realmente não importa. O que importa é a frequência. E quem te coloca em sintonia com essa frequência? CABOCLO

Este é um site de Umbanda e não de Candomblé (religião pela qual tenho imenso respeito). Seria estranho eu deixar caboclo de fora. Não existe ano bom e ano ruim, existe a pessoa dentro ou fora de uma sintonia com as energias regentes. Umbanda tem obrigação, filho de Santo tem obrigação, Orixá tem obrigação e por aí vai. Todo mundo sabe disso e não dá pra culpar o Tempo por aquilo que você deixou de fazer. E não importa o grau. Seja o banho do Caboclo ou a oferenda do Orixá ou Odu, a bola tá com você. 


 A soma de 2017 é...10 que para nós representa o número 1, o começo. Seja qual for o Orixá ou Orixás regentes, este é um momento de recomeços, de dar a volta por cima, de consertar o que está errado sob o seu ponto de vista. Também é um momento de buscar parcerias, de humildade para pedir ajuda e de muito trabalho (leia obrigações). 

Saturno chegou para arrumar sua bússola interna e, como dizem no Jogo de Búzios, "dar caminho". Converse com seu dirigente, converse com suas entidades, pergunte, questione e vai atrás. Ninguém planta sozinho. E a colheita de um, pode alimentar muita gente.

Sorte, saúde e prosperidade para 2017! Que seu Axé possa, também, ser o Axé de muitos. Nos vemos por aqui :)
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quarta-feira, 13 de abril de 2016

BABALAÔS, IYÁLORIXAS, ZELADORES DE SANTO E OUTRAS COSITAS MAIS


É praticamente impossível separar as contribuições do Candomblé e do Espiritismo de Kardec na Umbanda. A chamada "Umbanda Pura" é uma tentativa da criação de elementos personalizados que tornem a Umbanda mais única na sua atuação mas isso ainda deve levar muito tempo ou pode mesmo nem acontecer, já que não chega a ser um assunto que incomode tanto os dirigentes. O terreiro escolhe determinado caminho e pronto.

Sendo assim, temos a Umbanda que incorpora elementos do Candomblé (como os rituais para descoberta do Orixá Pessoal, Feitura, Decá, etc), a Umbanda com influência católica e espírita (onde os Orixás dividem espaço com Nossa Senhora, Jesus, etc no que chamamos Sincretismo) e até mesmo a Umbanda Esotérica que, do meu ponto de vista, gera muita confusão ao incluir outros elementos como Astrologia, Runas, Tarot e coisas do gênero. 

Diga-se de passagem que algumas entidades (como as pomba-giras ou ciganos) podem receber ordem para trabalhar com isso mas é preciso deixar claro que não faz parte da Umbanda de Tradição, assim como o Xamanismo também não se apresenta em todos os terreiros. Xamãs e Xamanismo serão comentados em outro artigo, ok?




Nesse balaio, onde entram tantos ingredientes que se misturam, a confusão com termos e definições é bem comum. A Umbanda sempre teve um aspecto bem "família", desde a sua criação por Zélio Fernandino de Morais em 15 de novembro de 1908. Palavras como "Irmandade" ou "Fraternidade" e chamar os médiuns mais velhos de "tios" ou "tias" faz parte de todo terreio como um recurso afetivo e pedagógico para aproximar e unir as pessoas em torno de um objetivo de caridade. Mesmo assim, é preciso entender certas denominações:



É fácil perceber que "pai" e "mãe" não são termos de origem africana mas brasileira. Estas definições vem carregadas de grande valor emocional para religião, principalmente em uma religião que recebe pessoas de diferentes gêneros e condições sociais. É uma responsabilidade anexada ao trabalho de atendimento onde fazemos o papel de pai, mãe ou tio de muitas pessoas que confiam, não somente nas entidades, mas também na qualidade de caráter do médium que incorpora. A importância disso não pode ser esquecida mas, infelizmente, muitos esquecem.

Não sou pai-de-santo, sou zelador-do-santo. O santo é que é meu pai. Eu acho esta nomenclatura (pai-de-santo) muito errada. Eu zelo. - Agenor Miranda Rocha

É por isso que eu gosto mais do termo "Zelador de Santo". Ele é claro na sua definição e não deixa dúvidas. Somos "cuidadores", responsáveis pelo nosso próprio crescimento e cuidadores daqueles que pedem a ajuda das entidades. Não das "nossas" entidades. Você e seu Caboclo, Preto-Velho, etc formam uma parceria pela caridade.  

Nenhuma entidade é de propriedade do médium. O Orixá de Cabeça, Segunda Linha, etc também não é seu. É uma parceria de trabalho e caridade, de desenvolvimento e crescimento conjunto. Sim, as entidades também crescem com o médium dedicado e podem até mesmo trocar de Linha de Trabalho se o médium cumprir corretamente o seu papel de cuidador. Preste um pouco de atenção nessa palavra: cuidador = cuidar da dor.

Não é fácil cuidar da dor do outro, assim como não é fácil cuidar da sua. Ser um cuidador não é estar sempre feliz e contente como se ignorássemos os problemas pessoais e do mundo. É estar alerta para os cuidados que os outros necessitam. É entender que você precisa ser humilde diante de alguém que pode ter mais problemas do que você ou não ter as mesmas ferramentas que você tem para cuidar desses problemas. Médium bom é aquele que sabe se colocar pequeno ou grande quando a necessidade aparece. Estar lá no momento certo para uma palavra ou ajuda que acenda a esperança no outro. Pode ser por um bate papo mesmo, sem incorporação. 

Seu caboclo te acompanha o tempo inteiro e não somente quando você veste o branco, coloca as guias e está no terreiro. Praticar a intuição para saber quem "está perto" ou pedir ajuda para uma entidade durante o dia, é sempre uma boa dica para manter a conexão diária e zelar pelo seu crescimento. 

Procure saber mais sobre as definições que passei, pesquise e estude para saber mais. Isso também é zelar. Axé e até a próxima!




PS.: Os vídeos acima são apenas para consulta e representam o ponto de vista dos seus autores e não, necessariamente, a minha.
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quarta-feira, 30 de março de 2016

FANTASMAS, ESPÍRITOS, APARIÇÕES, SUPERSTIÇÃO, MÉDIUNS E O SCOOBY-DOO


No creo en brujas, pero que las hay, las hay - Ditado Castelhano

 Tanto a Umbanda quanto o Candomblé oferecem um universo enorme de entidades, Linhas de Trabalho que se subdividem, seres Elementais (de água, fogo, ar e terra), etc.  Sério, são milhares e conhecer tudo isso pode levar mais de uma vida. Os nomes dados pelas entidades, por exemplo, guardam significados ocultos sobre sua origem e atuação e quanto mais diferente o nome, mais profunda pode ser a sua pesquisa (se isso te interessar). É por isso que médium não deveria ser supersticioso. Mas, a grande maioria é. E isso precisa mudar.

Como a Umbanda é uma religião relativamente nova (comparada com as outras) e sempre foi cercada de preconceito, a superstição popular acabou sendo agregada aos relatos de origem espírita e folclórica. Lembra algo como aquela história que não se pode misturar leite com manga para não morrer (um boato espalhado pelos senhores de engenho, entre os escravos, para que eles não roubassem os alimentos). Todos nós crescemos com alguma superstição ou crendice, vinda de nossos pais e avós. Para um médium, porém, isso pode ser especialmente prejudicial para tratar casos reais de perturbação espiritual, encostos, maldições familiares, etc. É nesse momento que pode surgir o médium Scooby-doo.


O médium Scooby-doo é aquele que acredita em tudo. Tudo mesmo. Ele acredita em duendes, fadas, bruxas, gatos pretos e o diabo a quatro. Em outras palavras, é uma pessoa muito sugestionável e de fácil manipulação por terreiros de intenções duvidosas (sim, têm um monte por aí). Podemos até dizer que duendes e fadas existem, mas não da forma que você conhece pelo cinema e pela literatura. Acreditar é mais fácil do que duvidar porque uma dúvida pode te levar a pesquisar sobre o assunto. E, além de prejudicar a si mesmo, o médium vai prejudicar o atendimento porque os consulentes também são, na sua maioria, Scooby-doos. Isso pode ser uma surpresa para você, mas os consulentes nem sempre falam a verdade. Eles contam o ponto de vista deles. E esse ponto de vista também é marcado por preconceitos, crendices e superstições diversas. Isso, sem falar que o consulente sempre quer parecer a vítima da sua própria história (o que pode ser verdade ou não).

A Fé é uma ferramenta poderosa para transformação do Mundo, se for bem administrada e dirigida. Boa parte do lado "misterioso" da Umbanda não é fruto do segredo dos rituais e procedimentos mas da falta de estudo (do médium) sobre o assunto. Por exemplo, na Idade Média, curas milagrosas aconteciam quase que diariamente nas pobres vilas e povoados para quem se tratasse com uma curandeira local (que depois seriam chamadas de bruxas). Elas possuíam um conhecimento diferenciado sobre ervas e unguetos (pomadas) mas o seu principal "ingrediente secreto" era a água. Essa água vinha dos baldes que os ferreiros da época usavam para resfriar as espadas, ferraduras e outras peças que fabricavam. Descobriu-se, depois, que essa água continha uma alta dose de partículas de ferro, uma vitamina essencial para o organismo humano, muito em falta para maioria do povo na Idade Média. Menos mistério e mais ciência e conhecimento em botânica, percebem?


Nos meus 47 anos de vida e quase 20 de Umbanda, só vi um "fantasma", o do meu avô. Fantasmas são definidos como espíritos ou almas porque ainda não surgiu uma explicação melhor e eu discordo dessa definição. Acredito que o médium moderno deve conhecer um pouco sobre o corpo humano, sobre botânica e sobre as vitaminas e doenças mentais para não aceitar um relato sem nenhum questionamento. História e Folclore também deveriam fazer parte do aprendizado. Sim, é muita coisa para conhecer e estudar, além da própria Umbanda. Mas essa é a verdadeira magia dessa religião: mexer com a nossa curiosidade e vontade de aprender mais e mais e sempre.

Menos Scooby-doo e mais conhecimento, galera. Axé e até a próxima!
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quinta-feira, 24 de março de 2016

PEJI, BANHOS DE ERVAS, ORAÇÕES, CANTOS E A CONSCIÊNCIA PRESENCIAL DO EU


Uma boa parte da tradição religiosa da Umbanda está concentrada nos cantos e orações, na criação do seu Peji particular. Um outro componente essencial para sua participação ativa dentro de um terreiro é a consciência presencial, o seu comportamento em comunidade. Bora, então, falar um pouco sobre isso.

No livro "O poder dos candomblés: perseguição e resistência no Recôncavo da Bahia" do autor Edmar Ferreira Santos (que pode ser adquirido gratuitamente, aqui), a palavra PEJI seria originária da língua fon "Kpeji", que significa "sobre o altar". Portanto, o Peji não é apenas uma mesa para colocar os objetos que você ganha no terreiro (imagens, pedras, cristais, etc) ou colocar o potinho da vela para rezar. Um Peji é muito mais que isso. O Peji de um médium é um ponto de força espiritual que protege sua casa, sua família e garante a manutenção da Tradição quando estamos afastados do terreiro.


O exemplo acima, é o meu próprio Peji, lá em algum momento de 2013 porque um Peji deve estar sempre em movimento e sendo modificado conforme as necessidades de energia da sua casa e do médium. Conheço várias histórias de preconceito sobre a presença de um Peji em casa. Se a sua família é católica ou de qualquer outra religião, pode haver conflito. Quando comecei meu Peji, choveram reclamações sobre "trazer negatividade para residência" e até uma sugestão amorosa de colocar o Peji na lavanderia, do lado da máquina de lavar! Se este for o seu caso, lembre-se que as pessoas ignoram o significado de um Peji e tente conversar. Em último caso, continue rezando no Peji do terreiro que você frequenta até que o momento adequado de ter o seu aconteça. Importante: sempre evite brigar sobre religião, principalmente com quem não está realmente interessado, ok?

Existem alguns preceitos para colocar o Peji em casa como a direção (Norte, Sul, Leste ou Oeste), deve ser uma mesa sem gavetas e coisas assim. Porém, nem sempre a pessoa vai ter o espaço necessário para isso. Se você mora em apartamento, a coisa fica pior ainda. Tradicionalmente, o Peji deve estar na posição onde o Sol (Oxalá) nasce, ou seja, Leste. O simbolismo disso seria que o médium nasce todos os dias para sua Iluminação (assim como o Sol), espalhando Luz por onde passa e não as Trevas. 

Tudo isso é muito bonito mas pouco prático quando se vive em um "apertamento" com quartos pequenos. Converse com o seu dirigente sobre isso para encontrar o melhor lugar para o seu Peji, dentro das suas possibilidades. Minha dica é colocar um "Sol" no seu Peji que pode ser na forma de uma escultura ou um tapete em frente ao Peji para se ajoelhar durante a reza. O importante é manter a cabeça firme, sempre.

BANHO DE ERVAS


Ainda existem terreiros que aconselham a não lavar a cabeça ao tomar banho de ervas e não posso deixar de comentar a falta de sentido nisso. A cabeça é o local mais sagrado do médium na Tradição porque é nela onde fica o seu Ori, sua energia vital, etc. O Ori (falaremos em outro artigo sobre ele) é um ponto de energia central muito sensível e este seria o motivo de se tomar banho apenas da cabeça para baixo. Porém, se "Sua cabeça é seu Guia", uma frase popular que teve sua origem no Candomblé, então é lá mesmo que o Banho de Ervas precisa atuar. Ao meu ver, cabeça e corpo não andam separado por aí. Novamente, depende do terreiro e é preciso respeitar a Tradição disso. 

Banhos de Ervas só podem ser passados pelo dirigente do Terreiro ou pela sua entidade (e, mesmo assim, com aprovação posterior do dirigente), portanto, não invente. Como dito acima, um banho com uma erva de um Orixá específico pode "zoar" legal a cabeça de um médium que nem conhece suas Linhas de Atuação ainda. Os banhos sempre têm como objetivo o equilíbrio do médium e o seu desenvolvimento. Existem banhos para aproximar as entidades que estão sendo trabalhadas, banhos para afastar negatividade e coisa e tal. Existem banhos para atrair a sua Linha de Esquerda e banho para te proteger contra ataques espirituais. Tem banho pra tudo. Se gosta da coisa, converse com um médium mais experiente (grau superior) e peça por alguns banhos leves de descarrego para stress, insônia ou algo assim. Sempre com a aprovação do dirigente, ok?

CANTOS E REZAS 


O cantor americano Bobby Mcferrin tem uma frase que eu gosto muito: s vezes, meu canto é uma reza e minha reza é um canto". Acredito que seja por aí. Existem milhares de Pontos de Umbanda que foram resgatados do passado e adaptados, outros que passaram por modificações em cada Terreiro e as difíceis rezas que vem do Candomblé, escritos em Yorubá e que nem sempre possuem tradução para todos. No Terreiro que participei, muitos pontos foram escritos pelos Ogãs e compositores da comunidade. O que importa é a sua concentração na energia que vai transformar o ponto ou a reza em um polo gerador de energia positiva

Do meu ponto de vista, cante e reze o que te inspira, o que te emociona. Sozinho, ajoelhado na frente do seu Peji, o canto é seu. Mas evite cantar alto em lugares públicos (como no seu emprego) se isso causa constrangimento para alguém. Uma corrente que sabe cantar bem os pontos, é uma corrente forte e uma gira mais forte ainda. Concentre-se, pratique e chame outra pessoas para ajudar a afinar a voz e encontrar a vibração certa para determinado canto. Rezas para Nanã, por exemplo, são como uma canção de ninar, em tom baixo e sereno, enquanto cantos para Ogun e Caboclo são cheio de energia e alegria contagiante. Se o seu Terreiro tem Ogãs, não tenha vergonha de pedir ajuda. Rezas e cantos são poderosas ferramentas para se atingir um grau de incorporação e quanto mais você aprender, melhor.

CONSCIÊNCIA DO EU NO TERREIRO


Quem vivencia um Terreiro, já sabe: é uma loucura. Existem centenas de coisas acontecendo ao mesmo tempo e a maioria delas não são do seu conhecimento. Tem médium que só chegou a tarde, tem outro que passou a noite lá, tem o que vai ficar depois que você for embora. Se você tem vidência, pode até ver o choque de energias se cruzando o tempo inteiro e não apenas durante a Gira. Um Terreiro é uma "caixa de força" que reúne energias nem sempre em harmonia. Vamos descobrir porquê não. E a resposta é bem simples.

Do ponto de vista espiritual, um Terreiro concentra energias das entidades mas também dos médiuns. Cada médium é um ponto de força em si mesmo, um elo da corrente que forma uma Gira e um Terreiro. E tem o médium desempregado, o que brigou com a namorada e até mesmo aquele que preferia estar na praia naquele dia de sol. Todos convivendo no mesmo espaço, com seus desejos e ambições (que podem ser positivas ou não), precisando preparar a Gira, limpar os espaços ou fazer uma reza. São diversos humores de vida em contraste, todos os dias em que tem Gira. Sentiu a responsabilidade do dirigente e dos médiuns mais graduados para manter esse ambiente em harmonia (quase) perfeita? É aqui que você entra.


Consciência Presencial do Eu é um termo bem chique pra dizer que todo o médium é responsável pela harmonia de um Terreiro, começando por si mesmo. Minha participação no Terreiro tinha uma regra básica: do portão para dentro, os meus problemas não existiam. E quando não conseguia atuar dessa forma, eu avisava que não podia ir. Simples assim. Consulentes vão no Terreiro para serem cuidados pelos médiuns porque acreditam que o médium é mais "resolvido", mais "elevado", coisas assim e para serem auxiliados. Eles esquecem que somos pessoas que podem ter problemas também e não estamos lá para lembrá-los disso mas para fazer nosso trabalho. O foco deve e precisa ser esse.

Pode ter certeza que você vai receber a sua própria ajuda das entidades no tempo certo mas o foco sempre será o consulente. Eu costumo dizer que quando entramos no Terreiro, somos o primeiro da fila e quando nos tornamos médiuns, vamos lá pro final (se der tempo). Uma maneira fácil de entender isso é saber que você está sendo desenvolvido o tempo inteiro e o consulente, não. Nem todo consulente vai virar médium. Ela vai, resolve o problema e pode não voltar mais. Para o médium de Umbanda, o desenvolvimento começa no tratamento que oferece dentro do Terreiro, na cortesia com todos e na alegria verdadeira da participação. Cara feia e falta de disposição não combinam com a energia de um Terreiro, ok?

Espero que estas dicas possam te ajudar. A Consciência Presencial do Eu é aquela onde "Eu" sirvo antes de ser servido e não é fácil de conquistar. Com a prática, você vai descobrir que esse "Eu" só é possível através do "Outro" que precisa da nossa assistência. Boa sorte com isso e até o próximo artigo.
Axé!
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